Separação obrigatória de bens: como estabelecer um Pacto Antenupcial restrito

Esse caso que vou relatar aqui é muito interessante e chama a atenção para dois pontos que sempre destaco e defendo, que é o pacto antenupcial e a obrigatoriedade do regime da separação obrigatória de bens para quando um dos cônjuges tem mais de 70 anos. Vamos ao relato e a decisão da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Reconhecimento

O ano era 2014, e o casal – ele na época com 77 anos e ela com 37 anos – procuraram um cartório a fim de regularizar a união estável, declarada com início em 2007.

Na Escritura Pública, o casal firmou um pacto antenupcial, com termos mais protetivos e na mesma não constava o regime da separação obrigatória de bens, que como falei anterior é exigida quando um dos cônjuges tem mais de 70 anos.

Algum tempo depois, o esposo veio a falecer e a viúva fez o pedido do inventário. Porém, uma das filhas do falecido deu entrada em recurso para que se retirasse a viúva da inventariança.

Decisões judiciais sobre o caso

O juízo de primeiro grau acolheu a impugnação dos herdeiros para excluí-la da meação ou partilha dos bens deixados pelo falecido e removê-la da inventariança. O Tribunal de Justiça do Paraná, apesar de reconhecer o caráter restritivo do pacto antenupcial, manteve a viúva na função de inventariante.

É interessante observar aqui, a explicação do relator do recurso no STJ, ministro Luís Felipe Salomão. Ele destaca que o Código Civil, em exceção à autonomia privada, restringiu a liberdade de escolha do regime patrimonial dos noivos em certas circunstâncias – como no caso de pessoa maior de 70 anos –, reputadas pelo legislador como essenciais à proteção de determinadas pessoas ou situações, as quais foram dispostas no artigo 1.641.

Ele reforça que o STJ já reconheceu que a norma se estende à união estável (REsp 646.259). E a Segunda Seção, decidiu que, no regime de separação legal, comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento ou união estável, desde que comprovado o esforço comum para a sua aquisição (EREsp 1.623.858).

Outro fator importante na decisão está relacionado ao fato de que no ano de 2016, o STJ também afastou “a obrigatoriedade do regime de separação de bens quando o matrimônio é precedido de longo relacionamento em união estável, iniciado quando os cônjuges não tinham restrição legal à escolha do regime de bens” (REsp 1.318.281).

Mesmo reconhecendo que a imposição do regime se dá por conta da idade e como forma de proteger o idoso e seus herdeiros, o ministro destaca que “é possível que o pacto antenupcial venha a estabelecer cláusula ainda mais protetiva aos bens do nubente septuagenário – afastando a incidência da Súmula 377 do STF do regime da separação obrigatória –, preservando o espírito do Código Civil de impedir a comunhão dos bens do ancião”.

Por fim, o magistrado concluiu ser possível que os noivos ou companheiros, em exercício da autonomia privada, firmem escritura pública para afastar a incidência da Súmula 377 do STF, perfazendo um casamento ou união estável em regime de separação obrigatória com pacto antenupcial de separação de bens (ou de impedimento da comunhão do patrimônio).

Minhas considerações

A minha orientação aos cônjuges é que, ao formalizar essa união estável, seja esclarecido na escritura quais bens cada um já possui, para que se evitem discussões judiciais no futuro.

A minha opinião é que o princípio da autonomia privada é desrespeitado quando a justiça abre uma exceção normativa para restringir a liberdade de escolha do regime patrimonial. No meu ponto de vista, o legislador preocupou-se mais com questões de cunho social e relacionadas a interesses de terceiros do que com o próprio indivíduo que “ralou” anos para ter o dinheiro e o patrimônio que possui.

É escolha dele(a), desde que esteja lúcido, consciente e capaz, fazer o que quiser com seus bens, mesmo que a escolha não seja a que a maioria das pessoas considerem “correta”.

Que bom que o Poder Judiciário aqui pontuou a autonomia privada para afastar a súmula 377 do STF. Minha pergunta é: será que o Poder Judiciário observaria também o princípio da autonomia privada para aceitar a escolha do falecido, em união estável ou casado a partir dos 70 anos, por um regime de bens diferente em que permite que seu “amor” tenha direito a herdar parte ou a totalidade de seus bens?

Por enquanto acredito que não, só que em um momento futuro tenho certeza que sim, isso ocorrerá! E você lembrará do dia que leu esse artigo!

 

E se você quer saber mais sobre regime de bens e pacto antenupcial, leia outros artigos que estão aqui no meu blog (clique aqui para ver). Depois, compartilhe se entender que pode ajudar outras pessoas.

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